Embrapa

Embrapa Uva e Vinho
Sistema de Produção, 3
ISSN 1678-8761 Versão Eletrônica
Jan/2003

Sistema de Produção de Pêssego de Mesa na Região da Serra Gaúcha

Flávio Gilberto Herter
Jorge Tonietto
Marcos Wrege

Início

Clima

Cultivares
Obtenção e plantio da muda
Preparo do solo, calagem e adubação
Condução,poda e raleio
Principais Pragas
Doenças fúngicas e bacterianas do pessegueiro
Doenças virais do pessegueiro
Doenças causadas por nematóides na cultura do pessegueiro
Cuidados na aplicação de agrotóxicos
Tecnologia de aplicação de agrotóxicos
Manejo e pós-colheita de pêssegos

Custos e rentabilidade

Referências
Glossário


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Autores
.Clima

     O clima possui forte influência sobre a cultura do pessegueiro, sendo importante na definição das potencialidades de cultivo das regiões. Ele interage com os demais componentes do meio natural, em particular com o solo, a variedade e as técnicas de cultivo aplicadas à cultura.
     Devem-se considerar três conceitos para diferenciar escalas climáticas (Carbonneau, 1984), de interesse em culturas:

Macroclima, ou clima regional, que corresponde ao clima médio ocorrente num território relativamente vasto, exigindo, para sua caracterização, dados de um conjunto de postos meteorológicos; em zonas com relevo acentuado os dados macroclimáticos possuem um valor apenas relativo, especialmente em matéria agrícola. Inversamente, um mesmo macroclima poderá englobar áreas de planície muito extensas.

Mesoclima, ou clima local, que corresponde a uma situação particular do macroclima. Normalmente é possível caracterizar um mesoclima através dos dados de uma estação meteorológica, permitindo avaliar as possibilidades para o cultivo do pessegueiro. A superfície abrangida por um mesoclima pode ser muito variável mas, normalmente, trata-se de áreas relativamente pequenas, podendo fazer referência a situações bastante particulares do ponto de vista de exposição, declividade ou altitude, por exemplo. Muitas vezes o termo topoclima é utilizado para designar um mesoclima, onde a orografia constitui um dos critérios principais de caracterização climática, como por exemplo, o clima de um vale ou de uma encosta de montanha.

Microclima, que corresponde às condições climáticas de uma superfície realmente pequena. Pode-se considerar dois tipos de microclima: microclima natural - que corresponde a superfícies da ordem de 10 e 100 m; e microclima da planta - o qual é caracterizado por variáveis climáticas medidas por aparelhos instalados na própria planta. O termo genérico bioclima é utilizado para essa escala, que visa o estudo do meio natural e das técnicas de cultivo.

     A influência do clima, considerando os principais elementos meteorológicos e fatores geográficos do mesmo sobre a cultura do pessegueiro, é descrita a seguir, em particular nas escalas macro e mesoclimáticas.

Elementos meteorológicos do clima
Fatores geográficos do clima
O clima da região da Serra Gaúcha
Modelos de brotação para o pessegueiro no Rio Grande do Sul

Elementos meteorológicos do clima

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Temperatura: A temperatura do ar apresenta diferentes efeitos sobre a cultura do pessegueiro, variáveis em função das diferentes fases do ciclo vegetativo ou de repouso da planta.

Temperaturas de inverno: as temperaturas de inverno são importantes para a fase de repouso do pessegueiro, conhecida como dormência. As temperaturas nessa fase são decisivas para completar a formação das gemas vegetativas e floríferas, bem como para o estímulo à planta para iniciar o ciclo vegetativo. Nessa fase, utiliza-se como indicador térmico o número de horas de frio abaixo de 7,2 ºC ocorrido no período. A Tabela 1 apresenta os valores médios de horas de frio mensal abaixo de 7,2 ºC indicativos para a região da Serra Gaúcha. É importante observar que cada cultivar apresenta uma necessidade de frio invernal, podendo variar de pouco exigentes a exigentes. Boa parte das cultivares necessitam de 600 a 1000 horas, enquanto que outras exigem menos de 100 horas. Pelas características climáticas da Serra Gaúcha, algumas cultivares e alguns anos podem apresentar problemas de florescimento e brotação desuniformes e insuficientes (erratismo).

Temperaturas de primavera: um sério risco ao cultivo do pessegueiro na Serra Gaúcha está na possibilidade de ocorrências de geadas no final do inverno, bem como daquelas mais tardias já na primavera. Os riscos ocorrem a partir da planta ter iniciado o inchamento das gemas, na floração ou na primeira fase de desenvolvimento do fruto. A Tabela 1 apresenta alguns elementos do risco de geadas para a região.

Temperaturas de verão: os melhores padrões de qualidade do pêssego (concentração de açúcar e coloração adequada), são encontrados em áreas de temperaturas de verão, em particular no período de pré-colheita, relativamente altas, sem serem excessivas, combinadas com temperaturas amenas à noite.

Insolação e Radiação Solar: A insolação e a radiação solar são fatores climáticos importantes nos processos de desenvolvimento e maturação dos frutos. 
     Ambos os fatores são maiores no período de verão, pelo fato dos dias serem mais longos e pela menor freqüência de chuvas e menor número de dias encobertos. A insolação também está atrelada às coordenadas geográficas pois, em latitudes maiores, os dias de verão são maiores e, consequentemente, maior o período de radiação solar e maior o potencial de insolação.
     A coloração e o tamanho são fatores determinantes da qualidade dos frutos de caroço, sendo também influenciados pela radiação solar. São características que o consumidor leva em consideração no momento da escolha do produto. Diversas técnicas culturais são empregadas para melhorar essas características, tais como: raleio manual ou químico, incisão anelar de ramos, poda verde e aplicações de fitorreguladores. Algumas dessas técnicas facilitam o desenvolvimento dos frutos e a penetração da radiação no dossel.
     Dentre os índices de qualidade de fruta influenciados por luz, destacam-se o tamanho da fruta, a firmeza, a concentração de sólidos solúveis, a acidez e a cor da epiderme.
     Normalmente a quantidade da luz interceptada pela fruta está em função da posição desta na copa. O tamanho das árvores, espaçamento, orientação da fila, forma da copa e tipo de sistema adotado influencia na distribuição da luz no interior das plantas. Frutas que recebem pouca luz desenvolvem maior intensidade de cor amarela, diminuindo assim a cor vermelha. Aumentando a exposição da fruta individual ao sol, há um aumento da absorbância de luz através da fruta, podendo aumentar a coloração vermelha.
     Outros fatores que afetam a coloração dos frutos são a temperatura e o nível de umidade durante o último período de desenvolvimento da fruta. Geralmente, o tamanho final e a produção de cor vermelha serão afetadas negativamente pela falta de umidade no solo. 

Pluviometria: A demanda hídrica do pessegueiro é variável em função das diferentes fases do ciclo vegetativo da planta. Durante o desenvolvimento das plantas, não somente a quantidade de chuvas, mas a intensidade e o número de dias ou de horas em que ela ocorre são determinantes. Ainda, deve-se ter em conta eventuais perdas por escorrimento superficial ou percolação. Durante a primavera, as chuvas são importantes para o desenvolvimento da planta, porém podem favorecer o desenvolvimento de algumas doenças fúngicas da parte aérea.
     O volume total de chuvas no Rio Grande do Sul é satisfatório, mas grande parte do Estado apresenta chuvas intermitentes, com grande irregularidade de distribuição ao longo do ano e, principalmente, entre os anos. Nos anos em que chove menos, em particular na metade sul do estado, os produtores podem ser descapitalizados pela baixa produção e pela obtenção de um produto de menor valor, com baixa qualidade, peso e diâmetro de frutos. Embora existam outros fatores climáticos e pedológicos que interferem no rendimento de frutos, a seca sempre foi o maior causador de frustração de safras no Brasil e no Mundo.
     A maior parte dos pomares de frutíferas no Rio Grande do Sul localiza-se no Planalto Sul-rio-grandense e está instalada em solos degradados física e quimicamente. São geralmente rasos e com baixa capacidade de armazenamento de água. Em anos com deficiência hídrica na primavera, a produtividade é baixa e há uma grande proporção de frutos pequenos. Assim, para a obtenção de frutos de qualidade, com bom tamanho e rendimento, é necessário o uso de irrigação complementar.
     A região com o maior volume de chuvas no Rio Grande do Sul é a Serra Gaúcha, a qual oferece uma barreira física à entrada de frentes frias. Predominam zonas de altitude, com temperaturas amenas na primavera e no verão, que contribuem para reduzir as perdas de água do solo. Dificilmente ocorre déficit hídrico, exceto em anos mais secos e onde os solos são mais rasos. Essa situação muda gradativamente da Serra Gaúcha para a Fronteira Oeste, onde chove menos e as temperaturas geralmente são mais altas, às quais induzem a uma maior perda de água do solo por evaporação e pela transpiração das plantas.
     A média de chuva na Serra Gaúcha é da ordem de 1700 mm acumulados anualmente, com déficit hídrico acumulado inferior a 10 mm na primavera e no verão.
     Do ponto de vista hídrico, além dos elementos meteorológicos referidos, é importante salientar a importância da reserva hídrica do solo. Essa é uma função da capacidade de retenção de água do solo, do aporte de água pela chuva e irrigação, das perdas por escorrimento superficial e por percolação, e da evapotranspiração, que inclui a transpiração do pessegueiro e a evaporação do solo. As condições de disponibilidade hídrica do solo para o pessegueiro, nas diferentes fases da planta, são relevantes para o desenvolvimento vegetativo e para a qualidade da fruta destinada ao consumo in natura.
     Cabe destacar que a ocorrência de granizo é um fenômeno prejudicial ao cultivo do pessegueiro, onde os maiores danos são causados durante o período do ciclo vegetativo, que vai da brotação à colheita.

Ventos: Ventos fortes podem causar danos à vegetação, inclusive com a quebra das pernadas. A propagação de doenças, em particular as bacterianas, também é incrementada pela ocorrência de ventos fortes.

Fatores geográficos do clima

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    Dentre os fatores geográficos do clima, a latitude é importante na definição das áreas de cultivo do pessegueiro no mundo. A latitude implica em efeito sobre a temperatura do ar, a qual diminui a partir do Equador à medida em que aumenta a latitude em direção aos Pólos. A Serra Gaúcha está situada em médias latitudes.
     Quanto à altitude, o efeito mais importante para o cultivo do pessegueiro é determinado pelo efeito térmico, já que 100 metros de elevação representam uma diminuição ao redor de 0,6 ºC na temperatura média do ar.
     Com relação ao relevo, a exposição e a declividade possibilitam a seleção de áreas para o cultivo do pessegueiro em um mesoclima particular. É o caso das encostas que privilegiam boa exposição solar, a qual possibilita colheitas com melhor qualidade, em áreas menos sujeitas à ocorrência de geadas. Nessa seleção de áreas também deve privilegiar-se os locais melhor protegidos da ocorrência de ventos frios e/ou fortes, o que auxilia no controle de doenças bacterianas e na redução de danos mecânicos à vegetação.
     As condições de declividade do terreno vão definir, juntamente com a exposição, a incidência de maior ou menor insolação. Situações de alta declividade do terreno não são recomendadas, seja pelos riscos de erosão, seja pela dificuldade de mecanização. Da mesma forma, áreas com elevado risco de geadas durante o período vegetativo devem ser evitadas.

     A Tabela 1 apresenta dados climáticos médios do período 1974-1980 para um conjunto de variáveis de importância para o cultivo do pessegueiro na Serra Gaúcha, nos municípios de Bento Gonçalves, Caxias do Sul e Farroupilha (dados compilados de Westphalen & Maluf, 2000).
     Os dados permitem caracterizar aspectos da peculiaridade climática da região, com implicações no cultivo do pessegueiro, relativamente ao conjunto de variáveis climáticas descritas acima.

     A dormência é a suspensão temporária do crescimento visível de estruturas das plantas contendo um meristema. Esse período vai desde a paralisação do crescimento, no fim do verão, até o inicio da brotação, na primavera seguinte (Lang, 1987). Para Champagnat (1983), a dormência de uma gema é a última etapa de uma cascata de inibições correlativas na qual a fonte está cada vez mais próxima dela mesma.
     O frio é considerado o principal fator exógeno para a indução à saída da dormência em gemas de espécies de frutíferas nas regiões temperadas (Nigond, 1967; Champagnat, 1983).
     A região sul do Brasil, apesar de ser de clima subtropical com algumas localidades temperadas, como é o caso da Serra Gaúcha, apresenta grandes variações entre anos, com invernos amenos, o que tem dificultado a adaptação de espécies e cultivares oriundas de regiões com invernos bem definidos, pois as mesmas geralmente apresentam respostas fisiológicas indesejáveis.
     A dormência das frutíferas caducifólias, como o pessegueiro, em zonas de clima temperado envolve três estágios: paradormência, endodormência e ecodormência (Lang, 1987). A endodormência é induzida e eliminada pelo efeito de baixas temperaturas durante o inverno. Portanto, é importante conhecer-se a duração de tal fase, para poder intervir, quando ocorre insuficiência de frio, com algumas práticas como no caso do uso de substâncias químicas para induzir a brotação.
     O efeito de baixas temperaturas em plantas frutíferas tem sido estudado por um grande número de pesquisadores. Weimberger, em 1950, foi quem primeiro propôs um modelo para estimar a floração em pessegueiro. O autor baseou-se no efeito de temperaturas inferiores a 7,2ºC, como as mais eficientes para eliminar a endodormência de um grande número de cultivares de pessegueiro. O método consiste na contabilização de horas em que a temperatura permanece abaixo desse patamar, durante o período de repouso das frutíferas, sendo que cada cultivar necessita acumular um determinado número de horas abaixo desse nível, para satisfazer a necessidade de frio. O modelo tornou-se o mais difundido e utilizado pela simplicidade de cálculo.
     Outros modelos foram propostos nestes últimos trinta anos, ressaltando o efeito de outros níveis de temperatura. Por exemplo, Erez & Lavee (1971) verificaram que as temperaturas de 3 e 10ºC tem a metade da eficiência comparada à de 6ºC, na eliminação da dormência em pessegueiro. Mais tarde, Richardson et al., em 1974, propuseram um modelo de Unidades de Frio (UF), onde cada temperatura tem efeito diferente na eliminação da dormência, podendo ser até mesmo negativo, quando a temperatura ultrapassa um determinado patamar.
   

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